Quem é Dorothy Counts?

Nas quatro horas iniciais do dia 14 de junho de 2020, 300 minutos após ter terminado de ver o documentário “Eu Não Sou Seu Negro” (I’m not Your Negro), um filme onde o diretor Raoul Peck, um cineasta haitiano, se utiliza do livro inacabado do romancista, poeta e crítico social estadunidense James Baldwin, me vi curiosamente incendiado pela história de uma pessoa citada no último… Dorothy Counts.

Porém, abordar o nome de uma mulher tão poderosa requer voltar um pouco no tempo.

O ano é 1951, quando Linda Brown, filha de Oliver Brown, tem o requerimento de matrícula recusado pelo distrito escolar público de Topeka, Kansas, onde a instituição citada ainda exigiu que a aluna viajasse de ônibus para uma escola negra segregada mais distante.

Diante disso os Browns e outras doze famílias que passaram por situações semelhantes em diferentes escolas, rapidamente entraram com uma ação contra o Conselho de Educação da cidade de Topeka alegando que a política de segregação era inconstitucional.

No contra-ataque, um painel formado por três juízes do Tribunal Distrital dos EUA para o distrito do Kansas proferiu o veredicto se respaldando na decisão realizada pela Suprema Corte em 1896, chamada “Plessy v. Ferguson”. Cuja determinação era manter a constitucionalidade das leis de segregação racial, desde que as instituições segregadas fossem iguais em qualidade, a doutrina ficou conhecida como “separada, mas igual”.

Foi só com a representação de Thurgood Marshall, advogado-chefe da NAACP (em português Associação Nacional para o Avanço das Pessoas de Cor), que a Suprema Corte decidiu ouví-los e finalmente em 1954, com a “Plessy v. Ferguson” anulada, foi decidido unanimemente  que a segregação racial nas escolas públicas eram inconstitucionais.

Nessa esteira de integração racial nas escolas públicas ou “desagregação obrigatória das escolas públicas”, estabelecida pela Suprema Corte, em 1956 na Carolina da Norte o advogado Thomas J. Pearsall foi o principal instigador do “Plano Pearsall”, cujo os termos eram bem simples.

Os alunos de pele branca poderiam receber financiamento para estudar em escolas particulares e não se misturar com os alunos retintos.

Caso os primeiros não fossem aceitos no sistema privado, não seriam obrigados a frequentar a escola mista contra sua vontade.

Em vez das decisões serem realizadas pelo Conselho de Educação da Carolina do Norte, o Plano Pearsall distribuiu a tomada de decisão entre os conselhos escolares locais individuais que eram formados apenas pessoas brancas, onde se justifica a “proteção” de tais conselhos com uma emenda de sufrágio de 1900, a qual prejudica os corpos negros não lhes dando o direito de concorrer a cargos ou votações, o que nos leva a enfatizar uma das decisões do Comitê de Pearsall, que foi dar poder de avaliação à comunidade, ou seja, um bairro predominantemente branco poderia votar para encerrar uma escola mista, caso achasse impróprio que seus filhos compartilhassem suas salas de aula.

No ano seguinte na cidade de Charlotte, ainda na Carolina do Norte, Dorothy Counts aos 15 anos de idade foi uma dos 4 (quatro) estudantes negros matriculados em várias escolas do estado, um em cada.

Junto com seu pai (Herman Counts), no caminho para a escola, o carro deles foi impedido de chegar perto do portão da instituição, antes de descer do carro seu pai lhe disse “Mantenha a cabeça erguida”, ela seguiu seu caminho a pé sendo escoltada por um amigo da família, Edwin Thompkins enquanto seu pai estacionava o carro.

Durante o caminho, a esposa de John Z. Warlick, um oficial do Conselho dos CIdadãos Brancos, incentivou as garotas brancas a cuspirem em Dorothy, houve também relatos de muitas pessoas atirando pedras, mas a maioria caiu diante de seus pés. 

Foram formadas barreiras por alunos, mas como Dorothy não hesitou as mesmas se abriram no último instante permitindo sua passagem.

Depois de quatro dias de aula, seus pais a transferiram para a Philadelphia, pois temiam pela vida da filha.

A foto do primeiro dia de aula foi registrada por Douglas Martin e foi ganhadora do prêmio World Press Photo do ano de 1957, em 2006, Dorothy recebeu um email de um dos estudantes que apareceu na foto ridicularizando-a pedindo desculpas.

Em 2008, Dorothy e outras sete pessoas receberam o Old State Award, foram homenageados por ajudar a integrar as escolas públicas da Carolina do Norte.

É nesse ponto que, como pessoas retintas, nos deparamos com pensamentos revoltantes de certa forma de “por que não deixaram-na ficar?”, “uma luta é feita de presença e representatividade! Não?!”.

A vasta revolta da nova geração repleta de informação com apenas um toque em conflito com a cautela de uma geração que já viu muitos morrendo por nada.

É nesse mesmo ponto que vemos a razão de não nos colocarmos à frente de situações perigosas, pois podemos não voltar. Nos protestos de 2020 muitos corpos negros foram e ainda estão indo às ruas para protestar contra a matança que ainda nos ronda e é justamente por esse motivo e pela pandemia que nos encurrala nesse exato momento, que muitos tem medo de ir, muitos pais e mães de filhos pertencentes a corpos negros sentem a mesma revolta, mas o medo de não ver mais seus filhos é devastador. É insuportável

Dorothy é uma heroína, por ter vivido esses quatro dias e por estar viva até hoje  

E é apenas isso que queremos, viver.

Abaixo você encontra o link parar assistir online ou baixar o documentário citado, qualidade em 720p. Estamos trabalhando para disponibiza-lo em uma plataforma melhor.

https://drive.google.com/file/d/1Hx2xWpcIn9TOqSuQaZpC9JqWb_pbikSV/view?usp=sharing

Crie um site como este com o WordPress.com
Comece agora